A cada ciclo eleitoral no Brasil, a presença do Poder Judiciário torna-se cada vez mais central na condução das eleições. Com centenas de processos movidos sobre propaganda irregular, direito de resposta, denúncias de compra de votos, questões relacionadas a coligações, adesões políticas e até o uso do fundo partidário, a judicialização se apresenta como uma salvaguarda necessária para assegurar a integridade do processo eleitoral. No entanto, essa intervenção, se não for cuidadosamente equilibrada, pode impactar negativamente o livre curso da democracia.
O papel do Judiciário nas eleições é fundamental. Ele age como o guardião das normas eleitorais e como árbitro das disputas entre candidatos, partidos e cidadãos. A legislação brasileira é robusta e prevê uma série de mecanismos para garantir eleições justas, desde a proibição de propagandas abusivas até a coibição de práticas como a compra de votos. Sem essa intervenção, a competição política poderia ser desvirtuada, favorecendo aqueles que têm recursos financeiros ou influência para burlar as regras. O Judiciário garante, assim, que a disputa seja o mais justa possível e que as decisões dos eleitores reflitam sua verdadeira vontade.
Por outro lado, a crescente judicialização pode gerar uma dependência excessiva das cortes para resolver problemas que deveriam ser enfrentados no campo político. Candidatos que, ao invés de investir em diálogos diretos com os eleitores, preferem judicializar cada disputa menor, podem sufocar o debate público. Além disso, a proliferação de processos durante as campanhas pode complicar questões mais relevantes para o eleitor, desviando a atenção dos programas de governo para batalhas jurídicas que nem sempre são de interesse coletivo.
Outro efeito colateral desse fenômeno é o impacto sobre o tempo e a credibilidade do processo eleitoral. Com uma infinidade de ações em curso, muitos resultados finais de eleições acabam dependendo de decisões judiciais, retardando a proclamação dos eleitos e gerando insegurança jurídica. O eleitor que comparece às urnas tem o direito de saber que sua escolha será respeitada, mas, em muitos casos, essa decisão final passa pelo crivo de tribunais, o que pode minar a confiança no sistema como um todo.
A questão da compra de votos é emblemática. Sem a atuação firme do Judiciário, práticas corruptas poderiam facilmente desequilibrar o jogo político, principalmente em regiões menos favorecidas economicamente, onde eleitores podem ser mais vulneráveis a influências financeiras. No entanto, a presença intensa do Judiciário nesse campo também aponta para uma falha estrutural: as campanhas eleitorais no Brasil ainda são reféns de práticas ilícitas, e isso levanta a questão sobre a eficácia de um sistema que, ao invés de inibir de fato essas práticas, se vê constantemente preso a julgamentos e punições.
A interferência do Judiciário nas eleições, portanto, é um mal necessário, mas deve ser exercida com moderação. Ele é crucial para manter a ordem e evitar abusos, mas não pode substituir o papel primordial dos cidadãos na democracia. O poder de escolher seus representantes e de conduzir os rumos políticos do país precisa estar, acima de tudo, nas mãos dos eleitores. O equilíbrio entre a aplicação da justiça e o respeito pela autonomia da política é essencial para garantir um processo democrático mais saudável e livre.
Dessa forma, é preciso que o Judiciário continue vigilante, mas também que as campanhas eleitorais e os partidos amadureçam, reduzindo a necessidade de intervenção. A democracia deve florescer em um terreno de debates livres e construtivos, com a Justiça aparecendo apenas quando for realmente necessária. A judicialização excessiva pode ser um sinal de que há muito a ser aperfeiçoado na dinâmica eleitoral brasileira, mas o caminho para esse aperfeiçoamento passa, inevitavelmente, pelo fortalecimento da cultura política e da educação do eleitorado. Somente assim será possível garantir eleições verdadeiramente livres e justas, onde o Judiciário seja o árbitro imparcial e não o protagonista das disputas eleitorais.