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Política EDITORIAL

OPINIÃO | Duas eras, dois estilos: 'Meu nome é debate'

O desafio é claro. Estamos prontos para voltar a exigir conteúdo, ou continuaremos a aplaudir o espetáculo?

25/09/2024 06h03
Por: Redação
Foto: montagem/Agência Brasil/Instagram/@pablomarcalporsp
Foto: montagem/Agência Brasil/Instagram/@pablomarcalporsp

O cenário político brasileiro sempre foi marcado por figuras que souberam, cada uma a seu modo, captar a atenção do público. Entre essas, Pablo Marçal e Enéas Carneiro são dois exemplos que, embora separados por gerações e contextos históricos distintos, possuem algo em comum: a habilidade de marcar presença em debates políticos. No entanto, o estilo e a forma como ambos se apresentaram nesses espaços revelam diferenças notáveis, que refletem mudanças na política e na sociedade brasileira.

O excesso como marca

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Enéas Carneiro, que se tornou uma figura icônica na política brasileira dos anos 1990, é lembrado por sua presença enérgica e quase teatral nos debates televisivos. Com seu bordão "Meu nome é Enéas", proferido em alta velocidade ao final de cada fala, ele capturava a atenção de quem o assistia. Enéas não se importava em moderar sua postura; pelo contrário, seu estilo quase bélico e suas falas inflamadas eram sua marca registrada. Para muitos, ele parecia o típico outsider, alguém que desprezava o politicamente correto e que se valia da polêmica para se destacar num ambiente competitivo.

Seus discursos, repletos de teorias de conspiração e críticas ao sistema político, eram densos e técnicos, mas envoltos em um formato que, embora caricatural, o tornou uma celebridade política. Enéas tinha o dom de transformar suas ideias, por mais complexas, em momentos de entretenimento, o que lhe garantiu destaque entre o público, mesmo que suas propostas fossem consideradas inviáveis ou radicais por muitos especialistas.

O disruptor digital

Pablo Marçal, por sua vez, representa uma nova era de candidatos e figuras políticas que emergem da interseção entre política e mundo digital. Empresário e influenciador digital, Marçal adota uma postura muito diferente daquela de Enéas nos debates, mas com a mesma intenção de causar impacto. Sua estratégia é mais voltada para o uso de gatilhos emocionais, com uma retórica motivacional típica de gurus do empreendedorismo.

Nos debates, Marçal se posiciona como alguém que oferece soluções práticas e rápidas, geralmente envoltas em um discurso de superação e inovação. Ele fala diretamente para a geração digital, apelando para conceitos de autossuficiência, sucesso financeiro e independência. Ao contrário de Enéas, que fazia questão de ressaltar sua erudição e profundo conhecimento técnico, Marçal aposta na simplicidade e acessibilidade das suas ideias, muitas vezes desconsiderando a profundidade técnica dos assuntos em prol de uma comunicação mais direta e empática.

No entanto, o que Marçal e Enéas têm em comum é o uso do espetáculo como ferramenta de destaque. Enquanto Enéas usava o choque e a força bruta da retórica, Marçal utiliza a fórmula do sucesso pessoal, transformando-se em uma espécie de coach político. Ambos, em contextos muito diferentes, subverteram as expectativas dos debates tradicionais, tornando-os algo além do confronto de ideias e propostas: uma arena para performance.

Entre o excesso e a simplicidade

A comparação entre Pablo Marçal e Enéas Carneiro revela não apenas duas personalidades políticas, mas dois momentos da política brasileira e sua relação com o eleitorado. Enéas representava uma era em que o debate político ainda se pautava pela seriedade das propostas, mesmo que fosse através de um estilo teatral. Marçal, por outro lado, é fruto de uma época em que as redes sociais e o imediatismo mudaram a forma como as pessoas consomem política, onde o carisma e a habilidade de "vender" ideias são mais importantes do que o conteúdo em si.

O legado do debate performático

Em última análise, tanto Enéas Carneiro quanto Pablo Marçal demonstram que o debate político, em tempos distintos, não é apenas uma troca de ideias, mas uma batalha por atenção e memória. Enéas deixou seu legado com a frase curta e imortalizada, enquanto Marçal marca sua presença na política com uma retórica inspiracional, típica da era digital. O que se observa, no entanto, é que, em ambas as abordagens, o debate é cada vez mais um espetáculo, onde a forma tende a superar o conteúdo.

Se o eleitorado se beneficiará ou não desse novo modelo de debate, isso ainda é uma questão em aberto. O que é certo é que figuras como Pablo Marçal e Enéas Carneiro continuam a nos lembrar que, no jogo político, ser ouvido pode ser tão importante quanto ter algo a dizer.

O desafio do eleitor

Que lição podemos tirar esses dois estilos? Em um momento em que a política parece mais fragmentada e polarizada do que nunca, a forma de comunicar pode estar se tornando mais importante do que o conteúdo em si. E isso levanta uma questão provocativa: será que estamos mais específicos em líderes que sabem nos convencer ou em líderes que realmente podem transformar?

Pablo Marçal e Enéas Carneiro representam dois lados dessa moeda, mas ambos deixam um alerta: o espetáculo da política, seja ele retórico ou emocional, pode acabar nublando o debate real sobre propostas e soluções. E talvez, como participantes, estamos nos deixando levar mais pela performance do que pela substância.

O desafio é claro. Estamos prontos para voltar a exigir conteúdo, ou continuaremos a aplaudir o espetáculo?

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