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OPINIÃO EDITORIAL

OPINIÃO | A nova face da política: a manipulação de identidades nas eleições de 2024

A manipulação da identidade racial ou étnica para fins eleitorais não é um problema novo

19/08/2024 15h37
Por: Redação
Foto: Agência Brasil
Foto: Agência Brasil

Em um cenário político cada vez mais dinâmico e multifacetado, um dado recente destaca-se como uma provocação inquietante: 1 em cada 4 candidatos que participarão das eleições municipais de 2024 alterou sua declaração de identidade racial ou étnica em relação ao que havia declarado em 2020. Ao menos 42 mil candidatos ajustaram essa informação na Justiça Eleitoral, um número que exige uma reflexão profunda sobre as dinâmicas de identidade e representação na política brasileira.

Para se ter uma ideia, a Paraíba é o estado com o maior número de mudanças na autodeclaração de identidade racial. 32,4% dos candidatos alteraram a cor/raça em seus registros na Paraíba entre as duas eleições. O percentual é maior do que a média nacional, que ficou em 24%.

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Em números, dos 10.078 candidatos registrados na Paraíba este ano, 3,26 mil postulantes alteraram a declaração de cor/raça no sistema ao registrar a candidatura.

A mudança não é apenas um ajuste administrativo; é um reflexo da manipulação de identidades para se adequar a um cenário político em constante mudança. Em um país com uma história de desigualdades raciais tão profundas como a do Brasil, a identidade racial ou étnica não é apenas uma característica, mas um elemento central da identidade social e política. Portanto, a decisão de mudar essa declaração pode ser vista como uma tentativa de navegar e explorar as complexas águas da percepção pública e do capital político.

É importante perguntar: por que tantos candidatos alteraram sua identidade racial ou étnica nas declarações eleitorais? Um olhar atento sugere que a mudança pode estar atrelada a uma tentativa de alinhamento com a identidade que mais ressoe com os eleitores ou que ofereça vantagens dentro do espectro político. No Brasil, onde questões de raça e identidade são frequentemente exploradas para maximizar o apelo eleitoral, essa prática pode indicar uma estratégia deliberada de construção de imagem.

Além disso, o fenômeno destaca a fragilidade e a maleabilidade das categorias de identidade na política. Quando as identidades são adaptadas para atender a objetivos eleitorais, a essência da representação autêntica e a luta por justiça racial podem ser diluídas. Em vez de promover uma verdadeira inclusão e representação, a mudança nas declarações de identidade racial ou étnica pode acabar se tornando uma ferramenta de oportunismo, desviando o foco das questões reais e profundas enfrentadas por diferentes grupos raciais e étnicos no país.

A manipulação da identidade racial ou étnica para fins eleitorais não é um problema novo, mas a escala atual nos chama a refletir sobre a necessidade de maior transparência e integridade no processo eleitoral. Devemos questionar a eficácia das políticas de cotas e da representatividade se as declarações de identidade podem ser alteradas com tanta facilidade.

A resposta a esse fenômeno deve vir de uma análise crítica e de uma reformulação das normas e práticas eleitorais. A sociedade precisa de um sistema político onde a identidade não seja apenas um recurso estratégico, mas uma verdadeira representação das experiências e das lutas vividas pelos cidadãos. A política deve refletir a diversidade e não ser um mero jogo de aparências, e isso só será possível se começarmos a tratar a identidade com o respeito e a seriedade que ela merece.

Neste contexto, a mudança nas declarações de identidade racial ou étnica vai além de uma simples curiosidade estatística; é um chamado à ação para garantir que a política brasileira seja conduzida com mais autenticidade e responsabilidade. Que possamos, enfim, avançar para uma política que não apenas represente, mas que respeite a complexidade e a profundidade das identidades que constituem nossa nação.

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